SUSTENTABILILIDADE – Como sobreviver com o cenário atual?

MOTIVO DO BOLETIM

Este boletim foi escrito com finalidade de compartilhar algumas percepções e experiências que podem fazer enorme diferença nos resultados financeiros e operacionais de uma clínica de diálise. Seu objetivo visa pontuar superficialmente sobre os desafios de uma Clínica de diálise até o momento de substituir o parque. Decisões como essas podem afetar para melhor ou pior os resultados de uma Clínica de diálise, tornando-a rentável ou inviável.

Quem assina é Marcelo Ferreira Ramos, sócio fundador da Attendance Eletromedicina Ltda, uma das maiores empresas em gestão de equipamentos médico-hospitalares de alta complexidade do Brasil, desde 1996.

 

 

Se você é proprietário ou administrador de uma Clínica de diálise conhece bem os enormes desafios que o setor atravessa atualmente. O fato do SUS ser o grande financiador da diálise no Brasil e adotar uma tabela quase que desrespeitosa, de tão baixa, aliado ao alto custo dos equipamentos e insumos, torna quase inviável a sustentabilidade de Clínicas de diálise em nosso país. E os desafios não param por aí: temos crise de mão de obra, escassez de médicos e exigências de primeiro mundo. Como lidar com essa situação?

Construindo uma Clínica Nova

DECISÕES ÚNICAS

Como dizia um grande e sábio amigo: “na crise os bons se sobressaem.”. Eis aí uma grande verdade. Poucas pessoas planejam adequadamente o negócio de hemodiálise. Quando vamos construir uma Clínica de Hemodiálise temos alguns desafios pela frente. Ao contrário de muitos ramos de atividade, não é preciso um estudo de demanda, pois, existem centenas de milhares de pacientes com insuficiência renal e sem tratamento. Então a preocupação principal torna-se o credenciamento junto às autoridades regulatórias. Porém, para conseguir o credenciamento, a Clínica deve estar completamente montada e com todos as rotinas devidamente escritas, incluindo os contratos de manutenção dos equipamentos e do sistema de tratamento de água.

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Será necessário planejar o local no qual a Clínica será construída. Isso é bastante importante, pois, conforme a legislação, ou o serviço de diálise deve ser ligado a um Hospital para atendimento aos casos de urgência ou deverá possuir um serviço de transporte e remoção.

Também é importante prever expansão em função do crescimento. É natural as clínicas de diálise aumentarem os pacientes, principalmente, se houver um trabalho sério de consultórios para captação e tratamento conservador dos pacientes renais nas fases prévias a insuficiência renal crônica.

No entanto, se essa decisão do local for bem tomada, será única na vida da Clínica. Conheço muitas clínicas que tiveram que buscar um novo local, pois, não havia mais espaço físico para comportar o crescimento. Quando falamos em espaço físico, estamos falando de estoque, espera de pacientes, ampliação de tratamento de água, ampliação de pontos nas salas de diálise, etc.

Uma vez eleito o local, com previsão de espaço para expansão é hora de fazer o projeto. É extremamente importante consultar não só um bom arquiteto e engenheiro, mas, envolver especialistas na área hospitalar e em normas para diálise. É muito comum encontrar projetos maravilhosos que, depois de prontos, tem que passar por uma adequação enorme por não atender normas específicas do setor. Não precisa nem falar o que isso gera de desperdício de dinheiro, tempo e energia, não é mesmo?

Para resumir alguns detalhes específicos, podemos citar alguns pontos que devem ser planejados:

Fluxo de entrada e saída de material, pensando sempre em material limpo e material sujo (contaminado);

Número de pacientes em cada sala. A norma preconiza, por exemplo, o número máximo de pacientes que cada profissional (técnico de enfermagem) pode cuidar. Então as salas têm que ser projetadas, pensando nisso, sob o risco de ter que colocar mais profissionais e menos pacientes;

Estoque e transporte de mercadoria até o salão e, depois, até o descarte;

Acesso de pacientes com necessidades especiais;

Sala de manutenção de equipamentos. Pode até parecer uma questão dispensável, mas, acredite, isso traz impactos e prejuízos para a clínica.

Por exemplo, é comum não haver pontos disponíveis para fazer a manutenção, o que pode gerar cobrança de atendimentos em horários extraordinários ou gerar atrasos nos reparos dos equipamentos. Também não é incomum, vermos equipamentos serem consertados no meio de pacientes em diálise.

Projeto do Looping com o mínimo de curvas possíveis e o menor comprimento.

Não creio que um arquiteto ou engenheiro que não seja da área, por melhor que seja, conseguirá prever pontos tão peculiares e que poderão causar tantas dificuldades no futuro.

 

foto 02 attOutra decisão importante é o parque de equipamentos que você vai escolher. Uma decisão errada neste quesito poderá comprometer completamente a rentabilidade do negócio. Vamos aos fatos: o parque de equipamentos, diferentemente da estrutura física, tem que ser renovado de tempos em tempos.

Sabendo-se que o custo dos equipamentos de diálise e tratamento de água representem quase metade do investimento total da Clínica é necessário acertar na marca escolhida, na manutenção e na hora de renovação do parque. O preço dos equipamentos talvez seja o menos relevante na hora de decidir sobre tudo isso.

Vamos fazer algumas contas:

Suponha que a marca A, custe R$50.000,00 e dure 10 anos, já a marca B custe R$40.000,00 e dure 7 anos e a marca C custe R$30.000,00 e dure 5 anos.

Rapidamente será possível compreender que o custo de aquisição anual do equipamento A é de R$5.000,00, do equipamento B é de aproximadamente R$5.700,00 e do equipamento C é de R$6.000,00.

Então, só por este primeiro quesito, vemos que a opção A é mais barata no médio / longo prazo.

No entanto, existem outros fatores muito importantes a serem considerados:

Tipo de garantia – Alguns fabricantes oferecem um programa de garantia completo, que prevê deslocamentos, hospedagens, alimentação, treinamentos de aplicação, peças, preventivas, etc. Outros, restringem seus programas de garantia, compartilhando custos com os Clientes, o que acaba por encarecer o custo do equipamento;

Tempo de resposta da assistência técnica. Na engenharia esse indicador é conhecido como MTTR – que é o tempo médio entre a abertura do chamado e a liberação do equipamento. Não adianta ter um atendimento rápido, se o equipamento fica parado aguardando peças de reposição. Isso provoca vários problemas, tais como, dificuldades em atendimento aos pacientes, estresse na equipe clínica e de enfermagem, lucro cessante ou aumento de custos com sessões em horários extraordinários e finalmente, possibilidade de contaminações severas quando o equipamento fica parado vários dias sem possibilidade de fazer um programa de desinfecção.

Custo da manutenção após a garantia – isso envolve mão de obra + peças de reposição. É impressionante as diferenças de preços entre uma marca e outra. Só a título de exemplo, cito algumas marcas, cujos técnicos estão situados apenas nos grandes centros. Isso significa que, se você não está no eixo RJ – SP, provavelmente deverá assumir todo o custo de deslocamento, hospedagens, talvez, passagens aéreas e, com certeza, o tempo de resposta será lento. Pesquise sobre isso antes de decidir.

 

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Lucro cessante – Para alguns fabricantes é natural que um equipamento fique 30, 40 dias parado aguardando importação de peças de reposição. Ocorre, que se o equipamento estivesse dialisando neste período (30 dias) o mesmo geraria uma receita de quase R$13.000,00 (72 sessões a R$180,00). 3 ou 4 eventos dessa natureza já daria para adquirir uma máquina nova. No mínimo, a quantidade de máquinas reserva em sua clínica teria que ser maior para suportar esse tipo de situação. Pense nisso.

Tempo de mercado – o ramo de hemodiálise movimenta bastante dinheiro e por isso mesmo atrai muitas pessoas que pensam em explorar esse negócio. No entanto, esse setor é fortemente auditado e não deixa espaço para amadores. Portanto, não se aventureem escolher uma marca que não esteja consolidada no mercado. A história da dialise recente no Brasil (de 1996 em diante) já presenciou a saída de empresas relativamente grandes e até então nenhuma marca que não esteja entre as líderes mundiais conseguiu permanecer por mais de 3 anos. Na hora de escolher pesquise a estrutura que empresa possui, tempo de mercado, procure saber o que ela fatura no país. Busque Clientes antigos e saiba se estão satisfeitos.

Finalmente e não menos importante, o planejamento do tratamento de água para pacientes crônicos. O que tenho presenciado é um total amadorismo neste quesito. Tratamento de água deve ser planejado, conforme a qualidade da água local, conforme a demanda de água tratada e conforme a normatização. Não é um produto que dá para encontrar na prateleira ou comprar de pronta entrega. Então, qualquer proposta séria para vender um tratamento de água tem que começar com um questionário no qual você deverá informar e comprovar, tudo sobre a qualidade da água que será tratada para os pacientes. O produto deve vir com projeto, memorial descritivo, planta, identificação de cada etapa e os procedimentos de manutenção (desinfecções) claramente descritos. Uma boa qualidade no fluido da diálise fará toda a diferença, tanto na qualidade de diálise dos pacientes, quanto nos aborrecimentos que serão evitados com resultados não conformes e possíveis reações dos pacientes.

Muito bem, após montada a Clínica de diálise, temos que pensar em equipe operacional, profissionais especializados e equipe médica. Dentre os profissionais especializados, citamos administrador, nutricionista, psicólogo, engenheiro, farmacêutico.

Temos que pensar em treinamento inicial de toda a equipe e em educação continuada para as devidas atualizações e para as eventuais reposições que forem necessárias.

Insumos e materiais – Eis aí uma questão de grande relevância. Algumas clínicas buscam redução de custo através de insumos que, muitas vezes, prejudicam os equipamentos e até pacientes. A título de exemplo, posso citar desinfetantes que podem causar agressões químicas no interior das máquinas ou linhas que provocam quebra de roletes e refluxos. Até o equipo de soro, tão simples, pode se tornar comprometedor quando se solta, após estar conectado à bolsa de soro (acidentalmente ou por baixa qualidade) e a solução salina cai sobre o equipamento, provocando, muitas vezes, a queima do mesmo.

Finalmente, abordo a hora de substituir o parque de equipamentos. Suponha que você adquiriu 20 máquinas. A primeira providência no sentido de manter o parque atualizado, na hora certa é fazer o provisionamento financeiro para esse momento. Mais cedo ou tarde será necessário substituir as máquinas. Mas, qual o momento certo para não perdermos dinheiro? Devemos esperar a assistência técnica condenar a máquina? Ou devemos continuar investindo enquanto ela estiver dialisando?

Deixemos a matemática falar por nós. Quanto mais velho fica um equipamento, mas, suscetível à falhas por desgaste natural. Esse fato acaba por tornar o custo da manutenção cada vez maior com o passar dos anos. É bem semelhante aos planos de saúde, que ficam mais caros com a idade dos usuários. Então, devemos reunir três informações básicas para saber:

  • Qual o custo total de manutenção do equipamento?
  • Qual o lucro cessante (ou disponibilidade) do equipamento em questão?
  • Qual o custo da prestação de um equipamento novo?foto 04 att

Vejamos:

Uma máquina cujo custo de manutenção fica em R$700,00 mensais = R$8.400,00 anuais. Essa diferença será recuperada apenas no primeiro ano de garantia. Então, é como se a máquina nova viesse com esse desconto. Nos anos seguintes, a diferença deve cair, pois haverá custo com manutenção, no entanto, provavelmente 1/3 do valor se você tiver feito a escolha certa.

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Outra análise importante é a disponibilidade. É muito importante que a máquina esteja com um índice de disponibilidade compatível com suas máquinas reservas. Por exemplo: se uma clínica possui 20 equipamentos e 1 máquina reserva, a disponibilidade de todos os equipamentos deve ser obrigatoriamente maior que 95%. Se um deles estiver menor que isso, haverá risco de não ter equipamento disponível em algum momento para dialisar o paciente, o que implicará em atrasos, turnos extras, insatisfações de paciente e equipe operacional. Isso não é mensurável e cada um deve valorizar da sua forma. Normalmente quem já enfrentou esse tipo de situação tende a valorizar muito e não querer passar por isso outras vezes.

Mas, se quisermos valorizar pela matemática, a engenharia nos diz o seguinte:

Uma máquina de diálise faz em média 72 diálises por mês. Considerando-se um valor SUS de R$180,00 por sessão de diálise, temos um faturamento de R$12.960,00 mensal e R$155.520,00 anual por máquina. Se a máquina está 95% do tempo disponível, significa que haverá uma perda de 5% (lucro cessante). Então, 5% de R$155.520,00 -= R$7.776,00. Se sua máquina estiver, por exemplo, com 85% de disponibilidade, você terá um lucro cessante de R$23.328,00 anuais. Com este cenário, em 18 meses haveria uma economia de aproximadamente R$45.000,00. Então, vale muito a pena substituir o equipamento. Detalhando a conta:

Se o lucro cessante anual é de R$23.328,00, significa que ao mês temos uma perda de R$1.944,00. Em 18 meses, teríamos R$34.992,00 + R$8.400,00 de economia com a manutenção no primeiro ano + a diferença de custo de manutenção no segundo ano.

Para calcular o lucro cessante é necessário medir 2 coisas:

Quantas vezes a máquina deu defeito e o técnico precisou intervir no equipamento nos últimos 12 meses e quanto tempo levou, em média, para resolver cada defeito. Obviamente, a maneira mais fácil de fazer isso é com um sistema de gestão de manutenção (que também deve ser muito bem escolhido e alimentado) ou terceirizando a assistência técnica para uma empresa que faça isso (que forneça os indicadores confiáveis).

Por exemplo, uma máquina que apresentou 8 falhas e que levou em média 48h para ser restabelecida, teve 384 horas de indisponibilidade no ano (8 x 48h).

Dividindo-se 384 horas por 24, encontramos 16 dias de indisponibilidade. 16 dias x 03 turnos = 48 sessões de diálise. 48 sessões x R$180,00 = R$8.640,00 de lucro cessante.

Esse mesmo equipamento têm capacidade de fazer 864 sessões de diálise por ano (considerando 3 turnos 6 vezes por semana). Se ele deixou de fazer 48 sessões, sua disponibilidade é de 94,4%.

Então, basicamente é isso. Se a disponibilidade está abaixo da quantidade de máquinas reservas e se o custo de manutenção está alto é o momento de pedir a proposta de uma máquina nova.

Acredito que, seguindo esses passos básicos, teremos um grande impacto na diferença dos resultados.

Leve isso em conta se você está no ramo.

 

  10 DECISÕES QUE AFETAM PROFUNDAMENTE UMA CLÍNICA DE DIÁLISE  

 

  • LOCAL ONDE SERÁ CONSTRUÍDA

 

  • PROJETO

 

  • PREVISÃO DE EXPANSÃO

 

  • ESCOLHA DO PARQUE DE EQUIPAMENTOS

 

  • ESCOLHA E PROJETO DE TRATAMENTO DE ÁGUA

 

  • ESCOLHA DOS INSUMOS E MATERIAIS

 

  • ESCOLHA DO RH

 

  • PLANO DE TREINAMENTO DO RH

 

  • MANUTENÇÃO DOS EQUIPAMENTOS

 

  • MOMENTO DE SUBSTITUIÇÃO DO PARQUE